quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

ENTREVISTA – DIÁRIO DO NORDESTE

ENTREVISTA – DIÁRIO DO NORDESTE



Diário - Sabemos que o senhor foi um dos primeiros intelectuais e estudiosos a reconhecer as qualidades da arte de Patativa, daí a sua contribuição para a vinda do "poeta do sertão" para a cidade e também para ele conseguir a projeção que alcançou. O senhor poderia contar um pouco dessa história? Como foi a descoberta do Patativa?


R – No início da década de 30, o jornalista José Carvalho deu ao jovem Antonio Gonçalves da Silva o cognome de Patativa do Assaré e, no seu livro “O Matuto Cearense e o Caboclo do Pará”, publicou um artigo reconhecendo Patativa como grande improvisador e inspirado poeta popular. No entanto, acredito que a primeira pessoa, de formação acadêmica, a reconhecer Patativa do Assaré como uma grande expressão literária foi José Arraes de Alencar (parente de Patativa, tio de Miguel Arraes e de Violeta Arraes), destacado filólogo no Rio de Janeiro, que, em visita a familiares, no Crato, ouviu Patativa, pela primeira vez, recitando seus poemas no Programa de Tereza Siebra, na Rádio Araripe. Maravilhado com a beleza dos versos do poeta de Assaré, José Arraes de Alencar incentiva-o a publicar o seu primeiro livro, “Inspiração Nordestina”, pela editora Borsói, do Rio de janeiro, em 1956. Com o livro pronto no matulão, viola nas costas, Patativa andou por todo o Ceará fazendo suas cantorias e vendendo o seu livro, para pagar a dívida que contraíra com o editor. Nesta época, fez contatos com o movimento das Ligas Camponesas e compôs poemas sobre a reforma agrária. Usando um pseudônimo, Patativa do Assaré publicou poemas em jornais de esquerda que refletiam as inquietações políticas do movimento operário-camponês. Antes deste reconhecimento “oficial” do “mundo letrado”, Patativa já gozava de alguma fama entre o campesinato pobre, por meio das cantorias que realizava, ao som da viola. O início da década de 60 encontra o Nordeste em plena ebulição política e social, notadamente em Pernambuco e na Paraíba, onde o movimento das Ligas Camponesas ganhara grande força entre a população rural. Em 1962, a convite do seu parente, o governador Miguel Arraes, apresentou-se com outros cantadores, em Recife, ocasião em que tomou conhecimento dos acontecimentos políticos recentes e fez contatos com lideranças camponesas pernambucanas e paraibanas. Nesta ocasião, ele cantou com os grandes nomes da cantoria nordestina. O golpe militar de 64 trouxe atribulações para Patativa, que viu várias lideranças do movimento camponês serem presas e também foi ameaçado de prisão. Neste período, Patativa relacionou-se de forma mais intensa com a intelectualidade democrática e esquerdista do Crato, principalmente com Edudoro Santana, Landim, Raimundo Bezerra, J. de Figueiredo Filho e Elói Teles de Moraes, que fazia um programa de poetas populares, na Rádio Araripe do Crato e torna-se um grande divulgador da sua poesia. Bom, com isto quero dizer que, bem antes, alguns nomes do meio intelectual e político do Cariri já reconheciam a importância de Patativa, mesmo que ainda fosse no âmbito regional.


Diário - Quando foi que você conheceu Patativa do Assaré?


R - Patativa era amigo dos meus pais, Zé Moura e Anita, e do meu avô Manuel Pereira, dono do Bar Tupy. Quando ele vinha do Assaré para as feiras do Crato, o caminhão misto que fazia o transporte de feirante estacionava próximo ao bar do meu avô. Patativa, muitas vezes, era levado pelo meu pai para almoçar na nossa casa e, depois do almoço, depois de fazer suas compras e se livrar dos compromissos, ficava algum tempo no bar Tupy, improvisando versos, recitando para as pessoas e “bebericando” algum conhaque. Estes recitais eram muito prestigiados, as pessoas sentavam-se nas mesas, ficavam em pé na porta do estabelecimento, aplaudiam, choravam, riam. Meu avô gostava da presença de Patativa no seu estabelecimento, pois aumentava a freguesia e, conseqüentemente, o seu lucro de pequeno comerciante. Durante toda a década de 1960, na minha adolescência, acompanhei Patativa do Assaré, nas feiras, e ouvia também os seus recitais na Rádio Araripe, ao amanhecer, no programa de Elói Teles. Foi no Bar Tupi e na bodega do meu pai que eu conheci os grandes nomes da cultura popular do Cariri. A feira era o grande palco para as apresentações destes artistas, e o bar do meu avô um ponto de encontro.


Diário - Como foi o seu primeiro contato com o Patativa?


R - Patativa hospedava-se, quando demorava por alguns dias no Crato, em uma humilde “pensão”, na ladeira do Joquinha, próximo do bar do meu avô. Acho que o primeiro verso que o vi recitando, para feirantes, no bar Tupy, foi “A Menina e a Cajazeira”, poema de intenso lirismo e profunda nostalgia. Fiquei emocionado. De outra vez, encontrei-o com muita raiva, alguém lhe roubara uma pequena mala com os livros que trouxera para vender aos comerciantes e feirantes do Crato. Nesta ocasião, ele improvisou um soneto bem desaforado e pessimista se referindo à dor da existência e à tragédia humana. No outro dia, quis anotar este poema, corretamente, mas Patativa se negou a recitá-lo, disse que não se lembrava. Depois ele o publicou totalmente modificado. A minha irmã, Rita de Cássia, aprendia poemas graciosos e brejeiros de Patativa, como “Maria Gulora”, para recitar na escola. Da maior importância para divulgação do poeta do Assaré, neste período, foi o trabalho do prof. Filgueira Sampaio, conhecido folclorista, que hospedava Patativa em Fortaleza e organizou as suas primeiras apresentações em Festivais folclóricos na capital.


Diário - Até quando durou esta sua convivência com Patativa?


R - Esta convivência semanal com Patativa durou até o início da década de 70, quando saí do Crato e fui estudar em Ouro Preto, em Minas Gerais. Durante este período, mantivemos correspondência, eu que fazia poemas “rimados” comecei a fazer meus primeiros poemas livres e diversifiquei minhas leituras. Quando voltei para o Crato (1972), o prof. J. de Figueiredo Filho, presidente do Instituto Cultural do Cariri, tinha lançado o livro “Patativa do Assaré, novos poemas comentados” (1970), com grande repercussão na região. Patativa alargou ainda mais o seu círculo de amizade com intelectuais e políticos democráticos que militavam na oposição. No Crato, juntamente com outros jovens escritores, poetas, compositores e atores, fundei o movimento de arte e cultura “Por Exemplo”. Patativa era por nós convidado a participar de shows, de recitais e de performances teatrais. Fazíamos coisas bem ousadas para época e Patativa (sempre zeloso na métrica e nas rimas) parecia divertir-se muito com aquilo tudo (ele adorava os versos “surrealistas” e experimentais de Geraldo Urano), tendo realizado inúmero recitais no Salão de Outubro, em praças públicas. Patativa foi muito próximo desta geração que, no Cariri, fazia arte de vanguarda, amava os Beatles, os Rolling Stones, a contracultura e juntava-se à cultura popular, em suas contestações. A tradição e a modernidade, o regional e o universal agitavam-se em nós, em insolúvel e criativo conflito. Neste período, alguns pesquisadores estrangeiros descobrem e anunciam a importância da produção poética de Patativa. Em 1978, por iniciativa do sociólogo Plácido Cidade Nuvens, foi lançado, pela Editora Vozes, com grande repercussão nos meios intelectuais brasileiros, o livro “Cante lá que eu canto cá”. Patativa do Assaré deve à publicação deste livro o seu reconhecimento pela intelectualidade dos grandes centros e o início da sua descoberta pela grande imprensa.


Diário - Quando você faz o seu primeiro filme com Patativa do Assaré?


R - A partir de 1978, comecei a trazer Patativa para algumas apresentações estudantis, em Fortaleza, e com Jakson Bantim, Salatiel e Dedê, iniciei o filme de média metragem chamado “Patativa do Assaré – um Poeta Camponês”, em super 8. Este filme foi exibido em 1979, durante a realização do Congresso Brasileiro para Ciência – SBPC . Em Fortaleza, em homenagem a Patativa, a SBPC nomeou seu congresso anual de “Cante lá que eu canto cá”. Neste mesmo congresso, organizei e dirigi, junto com o pessoal do grupo Siriará, o show “Canto Cariri”, que apresentou, no Teatro José de Alencar, dezenas de artistas populares do Cariri, entre eles Patativa do Assaré (o grande homenageado). Patativa participou de shows memoráveis, nesta época, sendo aclamado por lideranças intelectuais e populares de todo o País, e atuou no movimento pela anistia. A sua música “Canção do Pinto” torna-se uma espécie de hino libertário da anistia e da redemocratização do País. O jornal e movimento cultural “Nação Cariri”, do qual fui um dos dirigentes (ao lado de Oswald Barroso, Firmino Holanda, Itamar do Mar, Dedê, B. C. Neto, Carlos Emílio e Teta, entre outros), tornou-se um dos grandes divulgadores de Patativa, e ele participa dos inúmeros shows, recitais e caravanas culturais que são organizados por cidades do interior. Uma longa entrevista por mim realizada com Patativa foi publicada no livro “Cultura Insubmissa” (1982). Neste mesmo livro, Oswald Barroso publicou o artigo ”Patativa do Assaré – Nosso poeta do futuro”. Em 1994, juntamente com Jefferson de Albuquerque Jr, rodei (em 16mm, depois ampliado para 35mm) o filme “Patativa do Assaré – um Poeta do povo”, que foi legendado em vários idiomas para exibições em festivais nacionais e internacionais. O filme ganhou prêmios na Jornada Internacional de Cinema da Bahia e circulou no Brasil e no exterior. No movimento “Massafeira”, em 1979, organizei a participação de artistas populares do Cariri. Patativa do Assaré foi a estrela maior e realizou shows, apresentando-se ao lado de Fagner e de Ednardo. Consolidou também a sua amizade com jovens compositores cearenses. Ainda na “Massafeira”, a CBS grava ao vivo um disco, “Poemas e Canções”, produzido por Raimundo Fagner. Em 1980, Patativa se apresenta com Fagner em vários shows por todo o País, e a música “Vaca Estrela e Boi Fubá” torna-se um grande sucesso popular. Em 1981, Fagner produziria um novo disco de Patativa, “A Terra é Naturá”. Foi neste ano que Patativa deixou Serra de Santana e passou a morar em Assaré. Atendendo a inúmeros convites, apresenta-se em programas da Rede Globo, recebe homenagens oficiais e títulos de cidadão de várias cidades. O sucesso e o reconhecimento popular nacional de Patativa do Assaré, iniciados a partir da segunda metade da década de 70, consolidam-se no início da década de 80 e chegam ao seu apogeu em 1984, quando o poeta se faz presente em vários acontecimentos políticos e culturais, participando da campanha pelas “Diretas-Já”. Por todo o Nordeste, nos palanques e nos palcos, nas universidades e nas praças públicas, nas latadas dos sertões e nas feiras, recita os seus poemas, ao lado de grandes artistas e políticos que lutam pela redemocratização do País.


Diário - Quando começa a nascer o mito Patativa do Assaré?


R - Acredito que, quando ele fica cego de um olho, ainda na infância, o destino termina por lhe impor o trágico sinal de Camões. Depois, quando ele compra a viola e faz as suas primeiras cantorias, começa a sua trajetória para a imortalidade. Os poemas de Patativa são tão bem elaborados, tão sofisticados, em suas formas literárias, tão cheios de significados e de humanidade, que se tornaram famosos entre os segmentos mais pobres e socialmente excluídos da população sertaneja, bem antes mesmo do reconhecimento dos intelectuais. Patativa foi julgado, inicialmente, pela elite culta do Ceará, como sendo um poeta rude, analfabeto, matuto, beiradeiro. Em Fortaleza, eram muitos os intelectuais e escritores que tinham preconceitos com a poesia de Patativa. Isto foi mudando aos poucos. O encontro de Patativa com nomes como Luiz Gonzaga, Fagner e outros nomes da MPB foi importante para uma ampla difusão do seu nome e das suas canções. A resposta positiva por parte de críticos literários do sudeste aos seus livros e mesmo o interesse de alguns pesquisadores estrangeiros terminaram por mudar o enfoque da intelectualidade fortalezense sobre Patativa. A imprensa alternativa da época também desempenhou um papel importante no reconhecimento do poeta. Na década de 1980, quando a conjuntura política do País apontava para a democracia, no Ceará, esta mudança deu-se com a queda dos chamados “coronéis” e a ascensão do jovem empresário Tasso Jereissati, que foi eleito como Governador do Ceará (1986), com apoio da esquerda e de Patativa do Assaré. O reconhecimento oficial do Estado do Ceará, para Patativa, chegaria na forma da “Medalha da Abolição”, honraria que lhe foi conferida pelos “relevantes serviços prestados ao Estado”(1987). Quando, em julho de 1988, a Dra. Violeta Arraes assumiu a secretaria de Cultura do Estado, as artes eruditas e populares ganharam um novo impulso. Patativa passou a ser reconhecido, oficialmente, como um dos grandes ícones não apenas da cultura popular, mas também como um poeta erudito, artífice de rimas e métricas perfeitas, sendo colocado em alto pedestal. A entrega do diploma “Doutor Honoris Causa”, pela Universidade Regional do Cariri - URCA, em 1989, transformou-se em grande acontecimento cultural e político. Nesta época, produzi e prefaciei o livro “Ispinho e Fulô” (1988), importante coletânea de poemas de Patativa, e produzi e dirigi o disco “Patativa – Canto Nordestino” (1989). Patativa, neste período, era bastante requisitado, e os seus recitais eram grandes sucessos de público. Com algum dinheiro que ganhou de apresentações, recitais, livros e discos, começou a ajudar os netos a estudar. Ele sonhava formar todos os netos. O nome de Patativa crescia como fenômeno de comunicação de massa, e a imprensa nacional (rádio, jornal e televisão) dedicavam-lhe generoso espaço. Os festejos do seu aniversário naquele ano de 1989 foram encerrados com apresentação de Patativa do Assaré e Fagner, no memorial da América Latina, em São Paulo. O poeta começava a virar um mito. Acredito que a década de 1990 consolida a fama nacional de Patativa (já velhinho – encarnando o arquétipo do velho sábio e do grande pai). Ele, que muitas vezes fora negado pela cultura erudita e intelectual, tinha agora o reconhecimento oficial, além do profundo reconhecimento do seu povo. Popularmente, Patativa torna-se um mito (vivo), ao lado de outros mitos em constante mutação, como Padre Cícero, Antonio Conselheiro, Lampião e Cego Aderaldo. Seminários sobre a sua obra do poeta foram organizados por universidades de todo o Nordeste. O poeta B. C. Neto propôs homenagens a Patativa na Universidade Estadual do Ceará. O poeta recebeu títulos de “Doutor Honoris Causa” de destacadas universidades e teve os seus poemas publicados em antologias (“Letras ao Sol” - 1998, organizada por Osvald Barroso e Alexandre Barbalho) e traduzidos em vários idiomas. É iniciada uma profícua produção acadêmica sobre o poeta, destacando-se, no final do século XX e início do século XXI, os nomes de Gilmar de Carvalho, Tadeu Feitosa, Francisco de Assis Brito, Maria Silvana Militão, Oswald Barroso, Cláudio Henrique Sales, Luiz Tadeu Feitosa e a francesa Sylvie Debs, entre outros. Gilmar de Carvalho é, neste período, o mais dedicado e profícuo estudioso da obra de Patativa, contribuindo muito no seu reconhecimento pelo mundo acadêmico. Para escândalo dos “puristas” da cultura popular, Patativa do Assaré vira enredo de escolas de samba, tema de quadrilhas juninas e participa de novelas da Globo, ao lado de Geraldo Amâncio, a convite do ator e cantor Jackson Antunes. Patativa transforma-se, assim, em um “personagem” constantemente solicitado pela mídia.


Diário - Qual o grande acontecimento na vida de Patativa, neste período?


R - Um acontecimento triste. No dia 15 de maio de 1994, morreu Dona Belinha, que já se encontrava doente, paralítica, em uma cadeira de rodas. A morte da esposa deixou o poeta Patativa muito abatido e, durante algum tempo, ele se recolheu à sua casa, em Assaré, sem, no entanto, deixar de produzir os seus poemas, ainda belos e de grande lucidez. A humilde casa do poeta, em Assaré, virou local de verdadeiras “romarias”. Todos os dias chegavam automóveis e ônibus, cheios de pessoas vindas de todo o Brasil para visitá-lo, tirar fotografias ao seu lado e ouvir os seus poemas e até mesmo seus conselhos. Patativa Conselheiro. Patativa gostava de ficar horas recitando para estas platéias maravilhadas e gratificadas com a sua generosidade. Muitos outros acontecimentos ajudaram ainda a aumentar a fama de Patativa. Em 1995, o prof. Plácido Cidade Nuvens, incansável divulgador da obra de Patativa do Assaré, publicou o livro “Patativa e o Universo Fascinante do Sertão”. O poeta recebeu o “Prêmio Ministério da Cultura”, na categoria Cultural Popular. Novos seminários universitários sobre a obra de Patativa foram organizados e foram lançados novos CDs com seus poemas, novos álbuns de xilogravuras com a sua vida (verdade e imaginação) são publicados, e suas canções são gravadas por importantes nomes da música popular brasileira. Seu nome é dado a rádios comunitárias, centros culturais, escolas, estradas e até mesmo para rotular o lançamento de cachaça, em Juazeiro do Norte. Em 1998, no dia 10 de agosto, em sessão solene da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo, Patativa recebe o título de “Cidadão paulistano”. Em 1999, com grande participação popular, a presença do povo, de autoridade e artistas, é inaugurado, pelo Governador Tasso Jereissati, o memorial “Patativa do Assaré”, em Assaré. Por ocasião da IV Bienal do Livro, no ano de 2000, Patativa do Assaré foi novamente homenageado. Doente, sem poder viajar para Fortaleza, o poeta foi entrevistado por Dílson Pinheiro, em Assaré (no memorial), ao mesmo tempo em que artistas e autoridades lhe prestavam homenagens, no palco do centro de convenções, em Fortaleza. A TV Ceará transmitiu este programa ao vivo, com grande audiência.


Diário - Como foi o fim da vida de Patativa?


R - A partir de 2001, agravou-se muito a doença de Patativa. O poeta já não viajava e sofria com os constantes internamentos, em hospitais da região do Cariri. Mesmo assim, apesar da doença e do sofrimento, continuava a fazer versos que eram divulgados pelos jornais e pelas televisões, que insistiam em entrevistá-lo. Cada entrada ou saída de Patativa nos hospitais era pauta para os noticiários. O médico cratense José Flávio Vieira, que cuidou de Patativa nos seus últimos dias de vida, disse-me que ele encarava a morte com muita tranqüilidade, como merecido repouso. No dia 8 de julho de 2002, às 18:30 horas, morreu Patativa do Assaré. Todo o Nordeste chorou a morte do poeta e a notícia do seu falecimento foi publicada nos maiores jornais e revistas do País, em reportagens especiais e homenagens. No dia seguinte, com grande participação popular e a presença de autoridades e artistas vindos de todo o País, acontece o sepultamento do grande mestre da poesia brasileira. A morte é a completude. Patativa deixou a terra dos homens e entrou definitivamente no território do mito, o mito mais profundo, o mito que habita a alma de um povo e se abraça com sua eternidade. Desde a sua morte, o nome de Patativa do Assaré não parou de crescer. Suas canções foram regravadas, seus livros e CDs foram reeditados. Quando produzi e fiz a curadoria do “Festival Internacional de Trovadores e Repentistas” (2004/05) demos o nome de “Patativa do Assaré” ao troféu que homenageava os grandes nomes da poesia e da cantoria do Brasil e do exterior. Em 2007, no “XVII Cine Ceará – Festival Ibero-Americano de Cinema”, em Fortaleza, aconteceu a estréia nacional do filme de longa-metragem “Patativa do Assaré – Ave Poesia”, que montei com as imagens que fiz do velho mestre durante mais de vinte anos. A exibição do filme foi uma verdadeira consagração popular, registrada pela imprensa como a “comoção Patativa”.


Diário – Depois de livros, de discos e de filmes, o que você pensa ainda fazer em memória de Patativa?


R – Estou pensando em propor ao Governador Cid Gomes e ao Secretário de Cultura, Auto Filho, a construção de um Mausoléu. No pontão da Serra de Santana (onde nasceu e viveu Patativa), descortina-se uma bela paisagem do vale onde está situada a cidade de Assaré. A idéia é cortar um dos imensos monólitos ali existentes na forma de um cubo (como a Kaaba, a pedra sagrada dos muçulmanos), depois se revestiria este gigantesco cubo de granito com mármore preto e, em uma cavidade aberta na pedra, seriam depositados os restos mortais de Patativa e de Dona Belinha. Apenas uma placa de bronze anunciaria o jazigo perpétuo. No entorno, com a paisagem natural de lajedos e a flora da caatinga, seria cultivado um jardim, ao modo de um jardim Zen japonês: vazio e essencialidade. Este jardim sertânico seria um local de contemplação e de meditação. Outro desejo meu é organizar uma coletânea de poemas de Geraldo Gonçalves de Alencar, discípulo e parceiro de Patativa, extraordinário poeta, também de Assaré.

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